23 de junho de 2014

o não-retorno

Tenho estado meio ausente. Meio ainda é um eufemismo pra minha situação aqui... É que voltar trouxe muitas questões à tona, a maioria das quais eu ainda não estou preparada pra lidar. 
Já estou a caminho do meu quarto mês de Brasil. E passou voando, ao mesmo tempo que parece que Amsterdam ficou há três vidas atrás. Ou não, porque na verdade eu ainda me sinto espiritualmente presa aquele lugar. Mesmo que meu corpo esteja aqui há algum tempo. 
Rever a família e amigos é bom. Rever os lugares favoritos, comer as comidas que sentia saudade, se sentir em casa de novo. Só que não em casa de verdade. A sensação que dá é que eu nunca mais estarei em casa novamente. É tão clichê e tão verdadeiro aquela frasezinha que diz que uma parte nossa fica e nunca mais volta, e a que volta nunca mais será a mesma sem o que ficou. blá blá blá. 
A comida não é tão saborosa quanto a gente lembrava. Os amigos já não são mais tão divertidos. Os lugares continuam exatamente os mesmos desde a última vez que os viu. Fora uma novidadezinha aqui e ali, tudo continua igual. Exceto por eu mesma. 
Eu estou longe de ser a pessoa que era antes de viajar. E ainda mais longe da pessoa que era enquanto lá. É difícil reencontrar uma identidade no meio dessas duas pessoas, é difícil não se perder. 
Hoje foi um dia daqueles em que tudo estava indo bem até resolver ver fotos antigas. Como dói relembrar o tanto que amei aquelas crianças. Como dói ver a felicidade ali, quase palpável. Eu era feliz e sabia. Era tão feliz que não sabia o que fazer com tanta felicidade. As vezes ficava triste por ter felicidade demais e incapacidade de lidar e aproveitar por inteiro. Quando paro pra pensar em como eu era feliz, chega a ser ridículo. Essas fotos tem no meu rosto, nos meus olhos, nos menores detalhes o tanto de felicidade que eu tinha em mãos. Melhor nem compararmos com as fotos recentes. 
Não quero transformar esse texto num "confissões de uma deprimida", a vida vai indo como tem que ir. É só que sempre demorei a lidar com emoções e sentimentos. E o de encerramento de uma fase tão boa da vida é especialmente doloroso. 
Principalmente ao ver os rostos das minhas crianças. Eu posso ter lembranças maravilhosas em Berlin, Atenas, Paris... São sonhos de uma vida toda que jamais havia pensado em realizar. Mas o amor que eu tinha por aquelas crianças foi algo que eu nunca nem havia sonhado, muito menos almejado. Se posso dar uma dica as au pairs que as vezes ainda aparecem por aqui querendo saber mais sobre o programa é: AMEM SUAS CRIANÇAS. Vão ter dias que tudo vai ser horrível, mas no final os dias dos quais você irá se lembrar serão aqueles em que tudo foi maravilhoso. E essas memórias vão ser as únicas coisas que você terá delas pro resto da sua vida. 
Esse texto se chama "o não retorno" justamente por que essa é a sensação. Eu não voltei. A Isabella que estava lá, ficou lá. Existiu só enquanto lá. Aqui eu estou tendo que renascer. Um dia depois do outro. Estou vagarosamente aprendendo a enxergar uma certa beleza em São Paulo. Uma relação que oscila entre amor e ódio de minuto em minuto. 
Eu ainda não sei o que será da minha vida. Meu sonho europeu ainda não acabou, mesmo que eu já esteja ouvindo o despertador tocando ao fundo, e a luz do dia começando a entrar pelas pálpebras. Eu ainda estou sonhando. Presa nesse estágio. Em que a realidade do despertar já está chegando a nossa consciência, ao mesmo tempo em que o sonho ainda está ali na frente dos seus olhos. 
Não é fácil estar de volta. Nunca achei que seria. Mas é necessário seguir em frente e ver pra que esquina do mundo a vida irá me levar. Se um dia conseguir me despedir de Amsterdam. 

retratos de uma outra vida.